A publicidade está, inegavelmente,
presente no nosso dia a dia, afinal muitas das nossas escolhas pessoais são por
ela influenciadas. Afinal, o que vem a ser a publicidade? O termo tem a sua origem no latim publicus
e significa tornar algo público (SANTOS e CÂNDIDO, 2017). O senso comum costuma associar a publicidade apenas
a produtos e serviços com fins comerciais, entretanto a publicidade vai muito
além da divulgação de produtos e serviços,pois ideologias, fatos e até mesmo valores também são divulgados. Santos
e Cândido (2017) definem a publicidade
como a promoção ou divulgação de ideias, produtos ou serviços. A divulgação,
conforme os autores objetiva o lucro e, para tanto, precisa deixar claro quem
está divulgado e para que público-alvo tal divulgação se destina. Para atingir
seus propósitos e conquistar a preferência do público-alvo, a publicidade precisa
explora diferentes modos semióticos, de modo que haja persuasão por meio do
emprego de recursos criativos e atrativos.
Assim sendo, compreende-se que os diferentes gêneros publicitários são exemplos de textos
multimodais, uma vez que as múltiplas semioses são elementos inerentes na
composição dos diferentes exemplares de gêneros da publicidade.
A respeito da multimodalidade, Gomes e Silva (2018, p.57)
tecem as seguintes considerações:
A
multimodalidade consiste no uso de dois ou mais sistemas semióticos na troca de
informação e está presente tanto em textos predominantemente escritos, quanto
em textos visuais, sonoros ou cinemáticos, sendo um dos fatores responsáveis
pela construção dos significados durante o processo de leitura. Nesse sentido,
ela não é uma característica nova peculiar somente aos textos modernos, mas um
atributo natural da comunicação humana que sempre existiu.
Conforme a citação, a multimodalidade deve ser
encarada como uma característica inerente aos textos e, por isso, os significados
dos textos são condicionados pelas
escolhas dos elementos multimodais que os constituem. Ao escolherem os elementos
multimodais que constituem os textos publicitários, os anunciantes/ produtores desses
gêneros também recorrem, a depender de seus propósitos, a um outro importante
recurso: a intertextualidade.
Bazerman (2011, p.92) define a intertextualidade como “as
relações explícitas e implícitas que um texto ou enunciado estabelecem com os
textos que lhe são antecedentes, contemporâneos ou futuros (em potencial)”. Em
relação à metodologia de análise, o autor propõe seis estratégias de
representação intertextual, que ilustram não somente os tipos de intertextualidade, mas também os
tipos de interdiscursividade, quais
sejam: citação direta, citação indireta, menção a uma pessoa, a
um documento ou a declarações, comentário ou avaliação acerca de uma
declaração, de um texto ou de outra voz evocada, uso de estilos reconhecíveis,
de terminologia associada a determinadas pessoas ou grupos de pessoas ou de documentos específicos e uso de
linguagem e de formas linguísticas que
parecem ecoar certos modos de comunicação, discussões entre outras pessoas e
tipos de documentos. Além da multimodalidade e da intertextualidade, outro
recurso é considerado crucial na constituição da publicidade: a persuasão.
A respeito da persuasão, em sua obra Effective advertising:
understanding when, how and why advertising works, Gerard J. Tellis aborda os
elementos persuasivos que compõem a
publicidade. Para tanto, parte de um modelo desenvolvido por Cacioppo e Petty,
em 1985, para resumir os diferentes meios de persuasão presentes na
publicidade. Esse modelo, intitulado Modelo de Probabilidade de Elaboração,
emprega abordagens da antiga retórica, ou seja, os três meios de persuasão
segundo Aristóteles: logos (argumentos), ethos (endossantes)
e phatos (emoção). ). Em relação
ao primeiro meio de persuasão, o argumento ( logos), o autor afirma que esse recurso “convence um
espectador de uma mensagem apelando à razão e confiando em evidências” (TELLIS,
2004, p.151).
O segundo meio de persuasão, conforme já apontado, é a
emoção (logos). Valorizando o papel desse “estado de excitação”
(TELLIS, 2004), o pesquisador (2004) aponta os três modos pelos
quais a emoção despertada convence o destinatário à ação, quais sejam: 1. O
modo implícito, em que o anunciante desperta emoções ao incorporar uma mensagem
nos personagens envolvidos na trama, despertando empatia nos espectadores; 2. O
modo explícito, em que o anunciante desperta emoções, explicitamente, usando
estímulos para transmitir um ponto de vista, despertando simpatia em vez de
empatia, por parte dos espectadores; 3. O modo associativo, no
qual as emoções são despertadas por meio de estímulos que são apenas
tangencialmente relacionados ao produto, o que suscita, no espectador, a
associação entre determinada sensação/ emoção e o produto anunciado.
O
terceiro ato retórico, o endossamento (ethos) diz respeito às pessoas
contratadas para atrair e agir na persuasão do público-alvo, por isso, atuam
como agentes que reforçam a credibilidade à mensagem transmitida por
determinada publicidade. O endossamento pode ser feito por especialistas,
celebridades ou leigos (TELLIS, 2004).
Tomando
como referência a discussão teórica sobre esses relevantes elementos constituintes
da publicidade, analisemos, agora o vídeoclipe da música Thriller, do astro
pop Michael Jackson.
Exibido pela primeira vez em
dezembro de 1983, o clipe, até os dias atuais, é considerado uma referência no
que tange à produção audiovisual. O enredo inicia com um casal apaixonado
saindo de um automóvel e travando um diálogo próprio dos apaixonados, regado a
olhares e declarações amorosos. No entanto,
o clima de romance é interrompido quando a imagem da lua cheia é ressaltada e, partir desse momento, para desespero da garota,
o rapaz começa a se transformar em um lobisomem, iniciando, assim, uma
perseguição em meio a floresta. Quando o monstro está prestes a capturar a indefesa moça, o
espectador é surpreendido ao perceber que todo o enredo até ali não passava de
um filme de terror, assistido pelo mesmo casal, no cinema. Incomodada com as
cenas do filme, a jovem sai da sala de cinema antes mesmo de a sessão terminar,
o que faz com o que o namorado a acompanhe. Passado algum tempo, a música é, finalmente
introduzida e, à medida que avança, o cenário enfatizado passa a ser de um cemitério,
no qual vários mortos ressuscitam ao som da música e começam, junto com o
rapaz, a produzirem uma peculiar coreografia. A jovem, horrorizada, tenta
fugir, mas é perseguida pelos zumbis e seu namorado, agora também sob a forma
de morto-vivo. Mais uma vez, quando a
jovem está prestes a ser atacada, o espectador é surpreendido com uma nova quebra de
expectativa: tudo não passara de um pesadelo. Aparentemente, os jovens estão na
sala de espera do cinema e, antes de sair de cena, o rapaz, propositalmente,
olha para o espectador e revela olhos monstruosos, deixando um misto de dúvidas
e várias hipóteses sobre o que teria acontecido. Considerado um clássico da
cultura pop, tanto a música quanto o clipe influenciaram e continuam influenciando
inúmeras outras produções, como é o caso do comercial da Sky, intitulado Mansão
Sky. Vejamos:
No comercial , o enredo é
ambientado em uma mansão, entretanto uma mansão fora do padrão, tanto pelo aspecto
bastante sombrio quanto pelos sons de
uivos de lobos e outros efeitos sonoros que remetem a terror. Quando o
funcionário da SKY bate à porta, a música
Thriller, de Michael Jackson é iniciada. À medida que adentra a mansão, o funcionário
se depara com diferentes elementos assustadores: intensidade de uivos de lobos,
barulhos de asas de morcego, figuras assustadoras de fantasmas, esqueletos,
lobisomem e zumbis. No clímax, aparece a modelo Gisele Bündchen interpretando
uma vampira prestes a atacar o homem. Neste momento, há uma quebra de expectativa,
já que a vampira apenas diz “obrigada” no ouvido do funcionário. Em seguida, o
vídeo é interrompido pela frase: “Terror é não ter Sky”. No momento
final do comercial, todos os sombrios moradores da mansão estão sentados no sofá
e a vampira, interpretada por Gisele Bündchen, fala: “Ainda bem que agora a
gente tem SKY, que essa casa estava meio morta, né?!, o que provoca uma situação
cômica diante do contexto geral do comercial. Feitas as contextualizações do clipe
e do vídeo, passamos, agora, para análise
da publicidade “ Mansão Sky”, pautada, primeiramente em Bazerman (2021 [2006]),
conforme o quadro sintético abaixo:
Agora, analisemos o mesmo vídeo
conforme os critérios de Tellis (2004):
REFERÊNCIAS
BAZERMAN, Charles. Gênero,
agência e escrita; Angela Paiva Dionísio e Judith ChamblissHoffnagel(Org.).
Tradução e adaptação Judith ChamblissHoffnagel. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2021
[2006].
GOMES, Francisco Wellington
Borges; SILVA, Ana Paula de Oliveira. Multimodalidade e persuasão em uma peça
publicitária audiovisual. Entrepalavras, Fortaleza, v. 8, n. 2, p. 55-79,
maio/ago. 2018
LIM-FEI, V. & TAN, K.Y.S.
Multimodal Translational Research: Teaching Visual Texts. In: Seizov, O. &
Wildfeuer, J. (eds.). New studies in multimodality: Conceptual and
methodological elaborations. London/New York: Bloomsbury. 2017.
SANTOS, Anderson Inácio dos;
CÂNDIDO, Danielle. Por um conceito de Propaganda e Publicidade: divergências e
convergências. In: INTERCOM - SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS
INTERDISCIPLINARES DA COMUNICAÇÃO 40º CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA
COMUNICAÇÃO. 2017.
TELLIS, G.J. Effective advertising: understanding when,
how, and why advertising works. California: Sage publications, 2004.