sábado, 22 de outubro de 2022

INTERTEXTUALIDADE E INTERDISCURSIVIDADE

 

        Inicialmente abordado na literatura, o conceito de intertextualidade  foi introduzido, na década de 60, pela crítica literária francesa Julia Kristeva. O termo era empregado nos casos em que determinada obra literária recuperava elementos de uma outra obra literária. Apoiando-se no postulado do dialogismo bakhtiniano, a autora defende que todo texto é o resultado de várias citações, que são absorvidas e transformadas em um outro texto.

          Mesmo não se utilizando do conceito de intertextualidade, Bakhtin (2004)  argumenta que o texo não pode ser pensado em si mesmo, uma vez que é definido pelo diálogo estabelecido com outros textos. O dialogismo, para Bakhtin,  é o caráter essencial da linguagem  e princípio que constitui o discurso. Assim, nenhum enunciado é nosso, pois sempre traz consigo enunciados anteriormente produzidos, ou seja, “cada enunciado  é um elo na corrente complexamente organizada de vários enunciados” (BAKHTIN, 2003, p.272) .Nas situações comunicativas diárias, em que são produzidos diferentes textos (enunciados), sempre são recuperados conversas, fatos, notícias, e essa recuperação de enunciados anteriores, inevitavelmente, entra na constituição dos novos textos (enunciados) produzidos

          Koch, Bentes e Cavalcante (2007) ressaltam que a Linguística Textual incorporou o postulado dialógio bakhtiniano e, a partir dessa nova visão, o conceito de texto foi atualizado, passando a  ser o lugar no qual os sujeitos são constituídos e interagem  socialmente por meio de ações linguísticas, cognitivas e socias. Nessa concepção, segundo afirma Maingueneau (1976), o intertexto passa a ser um dos elementos decisivos das condições de produção dos enunciados, uma vez que o discurso é construído através de um já dito.  Corroborando a importância do intertexto, as autoras supracitadas postulam a existência de uma intertextualidade lato (ampla), constitutiva de todo e qualquer discurso, e de uma intertextualidade stricto sensu (restrita), que ocorre pela presença de um intertexto, anteriormente produzido, na  constituição de um novo texto. Esta última classificação, conforme já explicado, será norteadora deste artigo.

          No que tange à intertextualidade stricto sensu, as autoras elencam alguns tipos de intertextualidade bem como as características próprias de cada uma, quais sejam: intertextualidade temática, em que os textos partilham de um mesmo tema abordado; a intertextualidade estilística, em que há o uso de determinado estilo ou variedade linguística próprios de determinado autor, gênero ou segmento da sociedade; intertextualidade explícita, quando o intertexto, é identificado como pertencente a outro enunciador, com a menção da fonte;  intertextualidade implícita,  quando não há menção explícita da fonte do intertexto; autotextualiade,  em que o autor se utiliza, em seu texto, de trechos de outras obras suas; intertextualidade intergenérica, em que um gênero exerce a fução de outro; e a intertextualidade tipológica, em que há a partilha de sequências ou tipos textuais – narrativas, descritivas, expostivivas etc.

          A fim de dar um cunho mais didático ao post, é dada ênfase aos conceitos de intertextualidade explícita e de intertextualidade implícita. Na intertextualidade explícita “ um ou outro  texto ou fragmento  é citado, é atribuído a outro enunciador; ou seja, é reportado como tendo sido dito por outro  ou por outros generalizados[..]” (KOCH, BENTES, CAVALCANTE, 2012, p.28-29). Alguns exemplos representativos desse tipo de intertextualidade  são as citações, referências e  menções que são feitas, por exemplo, em  resumos, resenhas, textos argumentativos ou, ainda, situações de interação face a face. Vejamos, abaixo, o exemplo de intertextualidade explícita:

  


Fonte:<Fonte:https://www.facebook.com/nazareaorientadora/?fref=ts>


        Nos casos de intertextualidade implícita, o que se verifica é a omissão da fonte do intertexto alheio. A não explicitude da fonte do intertexto exige que o leitor ative sua memória discursiva, a fim de recuperá-lo.  Então, para que a produção de sentido se efetive de acordo com os propósitos do produtor do texto, o leitor necessitará estabelecer diálogos com os demais textos que compõem sua bagagem sociocultural: textos que já leu, filmes que assitiu, músicas que ouviu, fatos sobre os quais tomou conhecimento, dentre outros eventos comunicativos. Koch; Elias (2012) chamam atenção para o fato de esse tipo de intertextualidade envolver  manipulação do texto alheio, a fim de se alcançar efeitos de sentido diferentes. Dado esse maior nível de subversão, apresenta-se como um recurso bastante  empregado  na publicidade e na propaganda, como destacam as autoras supracitadas. Vejamos, agora, um exemplo de intertextualidade implícita.


          No escopo da literatura, Piègay-Gross (1996)  classifica as relações intertextuais em dois tipos:  relações de copresença entre dois ou mais textos e  relações de derivação de um ou mais textos a partir de um texto considerado fonte/matriz. No primeiro tipo de intertextualidade, a autora enumera a citação, a referência, a alusão e o plágio. Quanto ao segundo tipo, elenca  a paródia,  o travestimento burlesco e o pastiche. É importante  ressaltar que, mesmo sendo abordada, inicialmente, na literatura, essa proposta de classificação passou a ser aplicada também  em outros gêneros textuais.

          Conforme Piégay-Gross (1996), na citação é evidenciada a fonte do intertexto, com menção ao autor. A teórica pontua que  as citações podem desempenhar  diferentes funções discursivas, como atestar a verdade de um discurso ou  função de ornamentação, no caso de uma obra literária, por exemplo. A referência, mesmo apresentando certa semelhança com a citação, não apresenta transcrição literal do texto fonte, mas faz uma remissão a elementos presentes em outro texto, como personagens, por exemplo. Na alusão, por seu turno, o texto- matriz é retomado por meio de algumas pistas, de forma bastante sutil. Nesse caso, “não se convocam  literalmente as palavras nem as entidades  de um texto, porque se cogita que o enunciador possa compreender nas entrelinhas  o que o enunciador deseja sugerir-lhe sem expressar diretamente” (KOCH, BENTES e  CAVALCANTE, 2012, p. 127) Quanto ao plágio, a citação não é marcada, ou seja, embora haja a apropriação literal do texto do outro, não é dado crédito ao autor.

          No segundo grupo, Piégay-Gross define  a paródia como a transformação de um texto cujo conteúdo é modificado, mesmo se conservando o estilo. Verifica-se, nesse tipo de intertextualidade, o proprósito de suscitar o lúdico. Já  o travestimento burlesco  é entendido como a  reescritura de um estilo a partir de uma obra  cujo conteúdo é conservado. Diferente da paródia, retoma o tema, mas se afasta da forma do texto do qual é derivado. Por último, o pastiche  é apontado como a imitação de um estilo na qual foi conservada  a forma do texto imitado.

Exemplo de paródia:


REFERÊNCIAS 

BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes. 2003, p. 261-306.

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do métodosociológico na ciência da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1986.

KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3 ed. São Paulo: Contexto, 2012.

_______; BENTES, A. C.; CAVALCANTE, M. M. Intertextualidade: diálogos possíveis. São Paulo: Cortez, 2007.

_______; BENTES, A. C; CAVALCANTE, M.V. Intertextualidade: diálogos possíveis.

São  Paulo: Cortez, 2012.

MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: configuração, dinamicidade e circulação. In: KARWOSKI, A. M., GAYDECZKA, B., BRITO, K. S. (Orgs.). Gêneros textuais: reflexões e ensino. São Paulo: Parábola, 2011.

MORAES, Franciane; MENDES, Gustavo; LUCARELLI, Talita. Memes na internet: A web2.0 como espaço fecundo para propagação. XXXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Recife 2011.

PIÈGAY-GROS, N. Introduction à l’intertextualité. Paris: Dunod, 1996.

 


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